Um estudo que ganhou atenção da mídia nos últimos anos associou preferência por sabores amargos (como café preto sem açúcar, água tônica e rabanetes) a traços de personalidade “obscuros” — psicopatia, narcisismo, maquiavelismo e sadismo cotidiano. Aqui está uma matéria completa e acessível explicando os achados, os limites e o que realmente podemos (e não podemos) concluir.

O estudo — números, método e resultados principais
Pesquisadores da Universidade de Innsbruck, na Áustria, publicaram na revista Appetite resultados baseados em duas amostras combinadas com 953 participantes, com média de idade de 35 anos. Os voluntários responderam a questionários sobre preferências gustativas (quanto gostavam de sabores doce, azedo, salgado e amargo) e a testes de personalidade que medem o chamado Dark Tetrad: maquiavelismo, psicopatia, narcisismo e sadismo cotidiano. A análise mostrou uma correlação positiva entre gosto por sabores amargos e traços considerados “malevolentes”, sendo as associações mais fortes com sadismo cotidiano e psicopatia.

People who drink their coffee black with zero sugar often share these 8 surprising personality traits – VegOut

Fotos: Reprodução/VegOut

Como os autores mediram “gosto por amargo”?
Os participantes não provaram alimentos em laboratório — as respostas foram baseadas em autoavaliação, ou seja, o quanto cada pessoa dizia gostar de itens amargos, doces, salgados e azedos. Em parte das análises, os pesquisadores controlaram as preferências por outros gostos para verificar se o efeito era específico do amargo — e confirmaram que sim, dentro dos limites do estudo.

Interpretação correta: correlação não é causalidade
Os autores e outros especialistas ressaltam que os efeitos observados são fracos e que o estudo não prova que beber café preto “cause” psicopatia. O que ele mostra é apenas uma tendência estatística: entre as pessoas que disseram gostar mais de sabores amargos, houve uma leve tendência a pontuar mais alto em traços sombrios. Em outras palavras, trata-se de uma sobreposição em grupo, não de um diagnóstico individual.

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O que pode explicar essa relação?
Os cientistas propõem algumas hipóteses possíveis, mas sem afirmar nada de forma definitiva. Uma delas é que pessoas com maior tolerância a estímulos desagradáveis — como o amargor — talvez também tenham maior propensão a comportamentos de risco, algo que se relaciona a certos traços antissociais. Outra possibilidade é o contexto cultural: em muitas sociedades, o gosto por bebidas e alimentos amargos é comum e não tem qualquer conotação psicológica. Além disso, fatores genéticos e biológicos influenciam a forma como cada pessoa percebe o sabor amargo, o que pode afetar suas preferências.

Limitações importantes do estudo
Primeiro, o trabalho se baseia em questionários de autoavaliação, o que sempre envolve subjetividade e viés. Segundo, embora quase mil pessoas pareçam muitas, a amostra é composta por voluntários — portanto, não representa toda a população. Terceiro, as correlações encontradas são pequenas, o que significa que a maioria das pessoas que gosta de café preto ou alimentos amargos não demonstra traços sombrios. Por fim, não há qualquer prova de causalidade entre paladar e personalidade.

O que dizem os especialistas
Pesquisadores e psicólogos alertam que “psicopatia” é um termo clínico complexo e não pode ser determinado por hábitos alimentares. Além disso, preferências gustativas variam de acordo com cultura, idade, experiência e genética. Assim, é incorreto afirmar que alguém é psicopata apenas porque prefere café preto ou cerveja amarga.

Black coffee and psychopaths: Here's what the research says about bitter food and personality - ABC7 New York

Fotos: Reprodução/ABC7 New York

O que realmente aprender com esse estudo
O trabalho da Universidade de Innsbruck é interessante porque sugere que há pequenas conexões entre o que comemos e aspectos da personalidade, mas ele não define ninguém. É mais uma curiosidade científica sobre como gostos, cultura e comportamento se misturam. Gostar de café preto pode dizer muito sobre o paladar — mas quase nada sobre o caráter.