Em Nanjing, uma cidade de mais de oito milhões de habitantes às margens do Rio Yangtzé, há uma ponte que guarda tantas histórias quanto o próprio tempo. É imponente, longa e cercada pelo barulho constante do tráfego e do vento. Mas, entre milhares de pedestres que passam por ali, existe um homem que se destaca — não pela roupa, nem pela voz, mas pela missão silenciosa que carrega há mais de duas décadas. Seu nome é Chen Si, e ele se tornou conhecido como “O Anjo de Nanjing”.

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Tudo começou em 2003, em um dia aparentemente comum. Chen, então com pouco mais de 30 anos, avistou uma pessoa prestes a saltar da ponte. Movido por impulso e compaixão, ele correu, segurou o desconhecido e o convenceu a desistir. Aquela cena mudaria o rumo de sua vida. Desde então, todos os fins de semana, faça sol ou chuva, ele retorna à mesma ponte — não para passear, mas para vigiar a vida.
Sem uniforme, sem salário e sem reconhecimento oficial, Chen Si se tornou uma espécie de guarda invisível da esperança. Ele patrulha a ponte em uma scooter simples, carregando sempre consigo um telefone e algumas palavras de consolo. Quando avista alguém encostado no parapeito, ele se aproxima com cuidado. Fala baixo, pergunta o nome, oferece cigarro ou água. Às vezes, basta ouvir. Outras vezes, é preciso agarrar alguém no último segundo.
Estimativas apontam que ele já impediu quase 500 suicídios desde o início de sua missão. E o número pode ser ainda maior, pois nem todos os casos foram documentados. O que torna sua história tão comovente é que Chen Si não é assistente social, psicólogo ou parte de uma instituição. Ele é um homem comum — que vende mercadorias e trabalha durante a semana — mas que escolheu passar seus dias de descanso salvando desconhecidos.

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“Não sou herói”, disse em uma entrevista. “Apenas não consigo ficar parado vendo alguém desistir.”
Essa simplicidade é o que mais impressiona. Chen não tem recursos, mas oferece o que poucos conseguem: presença e empatia. Quando salva alguém, muitas vezes acompanha a pessoa até o hospital ou ajuda a contatar familiares. Em alguns casos, oferece abrigo temporário ou contribui com o pouco dinheiro que tem.
Com o tempo, ele se tornou uma figura conhecida entre a população local. Alguns o chamam de louco, outros de santo. Ele próprio rejeita ambos os rótulos. “Sou só alguém tentando fazer o que é certo”, costuma dizer.
Sua história ganhou o mundo em 2015, com o documentário Angel of Nanjing, que retrata o peso emocional dessa rotina — as conversas difíceis, o desgaste psicológico e o impacto de carregar tantas vidas nas mãos. O filme mostra o contraste entre a grandeza da ponte e a solidão de quem a patrulha, lembrando que o heroísmo, às vezes, nasce da persistência silenciosa.
A Ponte do Rio Yangtzé, construída nos anos 1960, é um símbolo nacional da China, mas também um dos locais com maior índice de suicídios do país. Por isso, a presença de Chen Si se tornou vital. Ele não apenas salva pessoas — ele interrompe o ciclo da invisibilidade, lembrando que alguém ainda se importa.

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Hoje, passados mais de vinte anos desde aquele primeiro resgate, Chen continua firme. O corpo envelheceu, a rotina pesa, mas a missão permanece. Perguntado se pretende parar, ele responde com a mesma serenidade que guia seus gestos:
“Enquanto houver alguém prestes a cair, eu estarei lá.”